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Xeque-mate nos criminosos: novas bombas de combustíveis terão certificação digital contra fraudes

Publicado em 21/08/2020 por Alessandra de Paula

Em entrevista exclusiva ao site do Combustível Legal, José Carlos da Silva Neto, diretor técnico da Cermob, empresa que atua no setor de tecnologia de segurança, fala sobre os novos modelos de bombas medidoras, munidas de certificação digital, que substituirão, gradativamente, as máquinas atualmente no mercado, podendo contribuir para diminuir as fraudes. Confira a seguir:

Combustível Legal: O setor de combustíveis é afetado por graves problemas de fraudes. Quais os perigos que esses crimes representam para os clientes e para os empresários honestos?

José Carlos da Silva Neto: Realmente, o setor de combustíveis é vítima frequente de fraudes. Estes crimes são cometidos em quase sua totalidade por quadrilhas vinculadas ao crime organizado. Para o cliente, sempre representa prejuízo. O cliente tem a qualidade do seu combustível adulterada, o que reflete diretamente na performance e nas peças do seu carro. As peças do carro são projetadas pelo fabricante para resistir à química do combustível regulamentado. Um combustível adulterado com solvente muda a sua química e isso pode rapidamente danificar as peças do veículo e, por conseguinte, o motor.

Outra situação que ocorre com mais frequência é o que chamamos de “bomba fraudada”. O consumidor é lesado diretamente no abastecimento. A bomba fraudada coloca menos combustível que o solicitado pelo consumidor, mas sem demonstrar em seu display. Os IPEMs já constataram fraudes acima de 25% de diferença, portanto, o consumidor compra o equivalente a R$ 100,00 de combustível e tem em seu tanque apenas R$ 75,00.

Embora a imprensa divulgue as fraudes, levando em conta apenas o consumidor, esquece-se dos empresários honestos.

Um posto de combustível que comete fraudes vende o seu combustível bem abaixo do preço de mercado, alguns abaixo do preço que a distribuidora pratica no fornecimento do produto. Isso causa um falso estímulo no consumidor.

A estimativa é a de que o consumidor, atraído pelo menor preço “fictício”, ande mais que 8 km para abastecer o seu veículo naquela revenda “mais barata”. Isso causa uma evasão de clientes, que prejudica toda a cadeia e, principalmente, os empresários honestos, que estão em um raio de 8 Km do posto que frauda.

Em consequência, empregos não são gerados, fecham-se empresas, investimentos e tudo mais. Portanto, embora a mídia sempre dê um foco direto no prejuízo da fraude para o consumidor final, o que é compreensível, esquece-se do prejuízo marcante do empresário honesto, que se arrisca todo dia em seu negócio, com o seu próprio dinheiro, trabalho e suor e tem amargado problemas recorrentes relativo às fraudes cometidas por grupos organizados e criminosos.

Combustível Legal: Novos modelos de bombas medidoras, munidas de certificação digital, vão substituir, gradativamente, as máquinas atualmente no mercado. Como originou esse processo?

José Carlos da Silva Neto: Então, em uma ação inédita, jamais vista em qualquer outro segmento, o setor de combustível se uniu completamente para combater e mitigar todas essas fraudes cometidas pelo crime.

Houve uma mobilização incisiva dos sindicatos da revenda e distribuidoras para requisitar aos órgãos competentes, ainda em 2013, o provimento de uma regulamentação de segurança para as bombas de combustíveis, que culminou na Portaria 559/2016 do Inmetro e ainda, nesse tocante, o setor expôs a tecnologia que foi implementada para ser utilizada nos equipamentos para garantir toda a segurança.

A importância de o setor ter se posicionado com a tecnologia é demonstrada quando se leva em conta o valor da fraude/sonegação existente. Por referência a uma estimativa realizada pelo Combustível Legal, são R$ 24 bilhões de reais em fraudes operacionais e sonegação/inadimplência por ano.

Para uma comparação, as fraudes financeiras no Brasil em 2019, matéria publicada pela Agência O Globo, geraram R$1.8 bilhões de prejuízo no ano. Veja que, as organizações criminosas fraudam mais de 13 vezes, em valor monetário, o setor de combustíveis do que o setor financeiro. Isso levou o setor a implementar um forte esquema de segurança, pois os valores e a capacidade de investimento do crime na fraude de combustíveis são muito maiores que a capacidade de investimento do crime no setor financeiro.

Combustível Legal: Fale um pouco sobre a tecnologia implementada?

José Carlos da Silva Neto: A tecnologia implementada pelo setor é mais que uma simples criptografia. Hoje, já existem fabricantes de bombas de combustível que possuem criptografia em seus equipamentos e, mesmo assim, são passíveis de fraude. A tecnologia implementada pelo setor leva em conta os requisitos mais nobres e atuais na questão de segurança da informação. E, por ser nacional, é de baixíssimo custo.

Por ser uma inovação, pela sua importância no contexto metrológico, e ser inteiramente brasileira, o Physikalisch-Technische Bundesanstalt (PTB), que é uma espécie de “Inmetro” alemão, convidou o grupo de desenvolvimento brasileiro para apresentar esta implementação em um dos workshops mais importantes do mundo em metrologia, o Software and ICT related Challenges in Legal Metrology, que aconteceu em Berlim, na Alemanha, em 2017, com a presença de mais de cinquenta países.

Ressalta-se aqui, que foi a única tecnologia apresentada por um país fora do eixo europeu e, atualmente, a sua implantação está sendo acompanhada por vários organismos de metrologia de vários países.

Combustível Legal: Como é feita a implementação dessa tecnologia nas bombas?

José Carlos da Silva Neto: A implementação projetada é bem simples e muito barata. O principal equipamento que realiza a medição de combustível na bomba é o pulser. Este equipamento é localizado na área protegida de explosões na bomba de combustível. Na placa de circuito eletrônico dentro deste equipamento é colocado um Módulo Seguro (secure element) que possui características de segurança similares ao chip que vai nos passaportes mundiais.

Mas apenas o Módulo Seguro não basta. Todo um processo de segurança e confiança foi desenvolvido: 1) a geração de uma cadeia de confiança digital utilizando três certificados digitais; 2) sistema operacional criptográfico do módulo seguro; 3) uma plataforma dedicada de certificação digital em salas cofres.

Isso garante que, caso um fabricante produza partes de seu equipamento em fábricas fora do país, será possível identificar seu equipamento por meio da sua cadeia de confiança. Todo o processo mitiga a entrada de equipamentos piratas.

Combustível Legal: Como funciona e quais as vantagens das bombas com assinatura digital para o mercado e para os consumidores?

José Carlos da Silva Neto: As vantagens são inúmeras. A principal é o devido controle total do abastecimento.

Com esta tecnologia, o pulser da bomba de combustível, equipamento que realiza a medição de combustível, poderá comunicar com o celular do consumidor final, transmitindo os dados de abastecimento e preço para um aplicativo no celular homologado pelo Inmetro. Este aplicativo valida os dados, conferindo as assinaturas digitais e demonstrando para o consumidor que o abastecimento foi realizado, qual valor envolvido e se o equipamento é reconhecido, além de manter todo um rico histórico de seus abastecimentos.

Estes dados assinados também podem seguir diretamente para os órgãos de fiscalização e controles fazendários, o qual alimentaria uma base de governo, para, por exemplo, realizar o balanço volumétrico, ou seja, seria facilmente detectável caso a revenda tivesse muito mais saída de combustível que a entrada registrada. O que mitigaria adulterações, ou mesmo sonegação, de forma muito mais imediata e assertiva.

Em suma, esta tecnologia foi implementada para mitigar fraudes e principalmente a concorrência desleal e predatória.

Outras situações previstas no projeto desta tecnologia são camadas extras para utilização de terceiros: como para os IPEMs. A cada verificação realizada pelo fiscal do IPEM, é possível guardar informações certificadas nos pulsers, transformando-os em um super lacre digital. Outro caso é a manutenção pelos mantenedores autorizados. Os fabricantes das bombas podem atrelar a mudança do status do equipamento de “operacional” para “manutenção” e “vice-versa”, por meio de um aplicativo instalado no celular do mantenedor. Isso garante que os técnicos que realizam as manutenções estejam em dia com os respectivos treinamentos dos equipamentos e possam certificar uma manutenção de qualidade e o dono do posto de combustível tenha toda a manutenção realizada, descrita de forma digital e assinada pelo mantenedor autorizado, o que favorece o controle e principalmente a garantia do equipamento.

A seguir, o esquema atual que é amplamente fraudado:

Abaixo, o esquema com a nova tecnologia:

Combustível Legal: Existe uma estimativa de custo dos equipamentos?

José Carlos da Silva Neto: Os fabricantes ainda estão realizando os cálculos de custo, mas estima-se que toda essa segurança envolvida representaria um ínfimo acréscimo em torno de 1% a 3% do valor de custo total de uma bomba de combustível, acrescidos aos custos de instalação e liberação do equipamento para venda final.

Combustível Legal: Outros países usam bombas com assinatura digital?

José Carlos da Silva Neto: Alguns países e fabricantes já utilizam bombas que possuem um canal criptografado dentro do equipamento, conforme mencionei acima, mas nenhum ainda utiliza uma tecnologia tão avançada, que envolve assinatura digital, quanto a implementada pelo setor e nenhum que possui uma comunicação segura com aplicativos para o consumidor. Por isso, essa inovação ganhou destaque mundial.

A implementação desta tecnologia de assinatura digital não apenas reforça a segurança da informação e do equipamento, mas alia questões jurídicas no tema, pois, a assinatura digital que envolve certificados digitais tem a mesma força jurídica de uma assinatura realizada pelo próprio punho, vide a lei MP-2200-2, que deu origem ao ICP-BR.

Portanto, os dados de abastecimentos assinados digitalmente pela nova bomba, que envolve o certificado do posto de combustível, se transforma em um ato perfeito de venda, que pode ser inclusive enviado com toda a confiança para os órgãos de fiscalização e controles fazendários.

Combustível Legal: As bombas de combustíveis começariam a ser substituídas a partir de junho/2023. Caso a bomba apresentasse qualquer irregularidade metrológica [problemas de quantidade], esse prazo seria antecipado, e o equipamento deveria ser trocado pela nova bomba com assinatura digital já a partir de junho de 2020. Como fica esse cronograma com as mudanças no Inmetro?

José Carlos da Silva Neto: Então, estamos em reunião constante com os entes de governo para isso. O setor se preparou e já possui todo o arcabouço tecnológico pronto e disponível, mas os entes governamentais estão atrasados nas suas respectivas liberações burocráticas. Acredito que isso se resolva ainda em agosto de 2020 e o cronograma seja retomado de forma acelerada.

Combustível Legal: O que o senhor acha dos critérios priorizados para a troca do parque de bombas?

José Carlos da Silva Neto: Os critérios foram estabelecidos em uma consulta pública ampla, o qual foi aceita por toda a cadeia. É um critério justo e bem estabelecido.

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