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‘O PL 164/22, junto com a monofasia, moraliza o setor de combustíveis no Brasil’, afirma diretor do CBIE

Publicado em 17/04/2023 por Alessandra de Paula

‘O PL 164/22, junto com a monofasia, moraliza o setor de combustíveis no Brasil’, afirma diretor do CBIE

Em entrevista exclusiva, Adriano Pires, sócio-fundador e diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), ressalta a importância da implantação da monofasia da gasolina, uma das iniciativas defendidas pelo Instituto Combustível Legal (ICL).

De acordo com Pires, a medida é fundamental para combater a sonegação, um problema grave que abala o mercado de combustíveis: “Ganham as empresas sérias, que pagam imposto; ganham os consumidores, que deixam de subsidiar o mau empresário, que vive de sonegação; e ganham os estados, que passam a arrecadar mais”, ressalta. Confira a seguir entrevista completa:

ICL: O Comsefaz, comitê que reúne os secretários de Fazenda dos estados, acertou fixar em 1,22 real por litro o valor do ICMS, que incidirá sobre a gasolina a partir da entrada em vigor da chamada tributação ad rem única para o combustível. A previsão é que passe a valer a partir de 1º de junho. Qual a importância dessa medida?

Adriano Pires: Essa medida já era esperada, tendo em vista que no governo Bolsonaro foi aprovada uma lei no Congresso dispondo que o regime seria monofásico e a alíquota passaria a ser ad rem. Houve uma confusão na época, com secretários de Fazenda e governadores reclamando de queda de arrecadação. Os estados chegaram a entrar no STF. O governo Lula resolveu a questão das perdas e tudo foi apaziguado. Agora o governo resolveu divulgar uma alíquota ad rem de R$ 1,22, inclusive no início era R$ 1,41, mas o STF colocou R$ 1,22. Estamos esperando alíquota de R$ 0,95 para o diesel.

No final das contas, quando você paga por uma gasolina que está sendo sonegada, como contribuinte, está pagando um valor que não te pertence

ICL: O que significa isso na prática para o mercado de combustíveis?

Adriano Pires: Essa mudança é muito importante no setor de combustíveis porque vai dificultar uma anomalia que o mercado enfrenta há alguns anos, que é a questão da sonegação. E uma das razões era que o regime não era monofásico, e a alíquota era ad valorem. Dessa forma, cada estado tinha um valor de ICMS diferente, o que estimula a sonegação.

A mudança é um ganho para o setor e para toda a sociedade. No final das contas, quando você paga por uma gasolina que está sendo sonegada, como contribuinte, está pagando um valor que não te pertence. A partir de agora, haverá mais segurança no mercado. É uma evolução.

Temos que ficar atentos a como os combustíveis serão tratados na reforma tributária. O ministro Haddad afirmou que o objetivo desse arcabouço fiscal é aumentar a receita. Reduzindo a sonegação, estamos ajudando a aumentar a receita do governo. A monofasia vai na direção do que está sendo pleiteado pelo ministro da Fazenda.

É uma medida de ganha/ganha: ganham as empresas sérias, que pagam imposto; ganham os consumidores, que deixam de subsidiar o mau empresário, que vive de sonegação; e ganham os estados, que passam a arrecadar mais.

O ICL já defendia a monofasia, e agora essa bandeira foi vitoriosa. Essa vitória é do setor, das secretarias de fazenda e do consumidor.

ICL: A que o senhor credita o fato de terem deixado o etanol de fora da monofasia? Por que o etanol deve ser incluído?

Adriano Pires: Os usineiros e os produtores de etanol não se sentiram confortáveis em adotar o regime monofásico. Na minha opinião, isso é um pouco de miopia da parte deles. A curto e médio prazos, esse regime deve ser adotado também para o etanol, porque eles vão ver os efeitos positivos da monofasia no mercado de combustíveis, principalmente gasolina e diesel.

De qualquer forma, não poderíamos esperar o consenso para adotar o regime monofásico. Se nesse momento a turma do etanol não quer entrar, tudo bem, vamos avançar degrau a degrau.

Quanto maior a sonegação, menos o governo arrecada. Temos que mostrar que existem algumas medidas para aumentar arrecadação, que não significa necessariamente aumentar imposto

ICL: Quais as suas expectativas em relação à reforma tributária? Atualmente, existem duas PECs tramitando: a PEC 45/2019, na Câmara dos Deputados, e a PEC 110/2019, no Senado Federal. O que seria mais adequado para o mercado de combustíveis e por quê? Existe alguma chance de a reforma tributária ser aprovada esse ano?

Adriano Pires: Acho que, no final, nenhuma dessas duas PECs vai prevalecer. Vão aproveitar algo das duas. Creio que haverá uma negociação na Câmara e no Senado. Espero que, finalmente, aprovem a reforma tributária, que é uma demanda da sociedade. Tentaram fazer em vários governos, e nenhum conseguiu. Não foi para frente porque há sempre um setor que se acha prejudicado. Ninguém está disposto a ceder para que a reforma tributária ocorra. Espero que os deputados e senadores entendam a necessidade dessa reforma.

Em relação aos combustíveis, entidades como o ICL devem ficar atentas a essa discussão. Gasolina e diesel são considerados bens essenciais. Se isso for alterado, se deixarem de ser tratados como bens essenciais, haverá impacto no setor. É importante ficar atento à tramitação dessas PECs, mostrando a importância do setor de combustíveis como um dos maiores arrecadadores de impostos.

ICL: Ainda no que diz respeito à legislação, o PLS 284/17, que caracteriza a figura do devedor contumaz, foi substituído pelo PL 164/22. Qual a importância de apoiar essa iniciativa?

Adriano Pires: Esse projeto tem que ir para frente. Já está tramitando há muito tempo no Congresso e sempre adiam a votação, botam na gaveta, trocam de relator… Essa é outra bandeira do ICL que deve ser defendida. É um bom momento para se tratar disso, porque é início de governo.

Quanto maior a sonegação, menos o governo arrecada. Temos que mostrar que existem algumas medidas para aumentar arrecadação, que não significa necessariamente aumentar imposto. Aumentar imposto é sempre uma medida antipática, pois ninguém gosta de pagar mais impostos. Reduzir a sonegação é uma medida simpática para todo mundo, menos para o devedor contumaz. Esse PL para combater o devedor contumaz é fundamental junto com a monofasia. Temos um conjunto de ações que moraliza o setor de combustíveis no Brasil.

ICL: Além da sonegação, quais outras práticas ilícitas preocupam o setor de combustíveis?

Adriano Pires: Precisamos estar atentos à questão da adulteração. Normalmente, quando se reduz a sonegação, há uma elevação da adulteração e de práticas heterodoxas, como bomba fraudada. A fiscalização deve ficar muito atenta.

Tem distribuidora aí que quando compra gasolina lá fora, compra como se fosse nafta para pagar menos imposto. Isso também acaba trazendo uma grande deturpação no mercado, pois o produto pode ser vendido muito mais barato, já que não pagam o imposto de importação de gasolina.

Tem que ter fiscalização. O governo tem que olhar com uma lupa grande essa situação de importação, até porque a sonegação do imposto de importação não é resolvida pelo ICMS monofásico ad rem.

O setor de combustíveis gera muito dinheiro, é um mercado com muita liquidez e bem visado por empresários mais heterodoxos que têm bastante criatividade. Você tapa um buraco aqui, o cara abre do outro lado. É uma briga contínua, uma fiscalização permanente.

ICL: Como o senhor tem visto o cenário energético brasileiro? Quais os maiores desafios e prioridades, na sua visão?

Adriano Pires: Estamos em um governo novo, não dá para falar muito sobre as políticas que vão adotar. Temos que esperar. Mas acho que teremos um ano com o preço do petróleo subindo. No primeiro semestre, estamos prevendo de 80 a 85 dólares. E no segundo semestre, de 90 a 95 dólares, podendo chegar a 100 dólares. O preço médio deve ficar em 87 dólares.

Isso significa um desafio para o governo. O preço do petróleo vem caindo, e em 2022 teve uma queda maior por conta da crise dos bancos nos Estados Unidos. Se esse cenário se concretizar, com preços mais elevados, que política de preços o governo vai ter para o setor de combustíveis?

Hoje, por exemplo, há um cenário confortável para o etanol, já que voltaram a reonerar o ICMS de gasolina e etanol, mas deixaram uma diferença para que o etanol não perdesse a competitividade. No entanto, os usineiros ficam preocupados, pois se o preço do petróleo sobe, e o governo resolver travar o preço do mercado interno, pode haver uma perda de competitividade no etanol.

Acho que a partir de maio, vamos ver que política de preços a Petrobras vai adotar, e espero que não seja uma política de represar preço de gasolina, diesel, pois isso é muito ruim para o mercado, para a Petrobras e para todo mundo. Já vimos essa política lá atrás e não funciona. É um cenário muito desafiador para o governo Lula nesse primeiro ano.

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