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‘Caminhos da sonegação’: lavagem de dinheiro, falsificação de notas… especialistas apontam como os criminosos agem no mercado de combustíveis

Publicado em 17/12/2020 por Redação

Na segunda reportagem da minissérie documental Caminhos da Sonegação (confira a primeira parte), os advogados Júlio Janolio e Octávio da Veiga Alves, do escritório Vinhas e Redenschi Advogados, falam sobre as diversas práticas adotadas pelos sonegadores no setor de combustíveis. Confira a seguir:

Combustível Legal: Já vimos que o mercado de combustíveis é fortemente afetado, seja pelos devedores contumazes de impostos, ou por artimanhas como a utilização indevida de títulos precatórios para o pagamento dos tributos. Hoje, uma boa parte do produto comercializado vem da importação que, normalmente, é muito fiscalizada. Existe alguma prática ilegal neste mercado de importação para burlar o fisco?

Julio Janolio e Octávio Alves: A abertura de empresas offshore para lavagem de dinheiro é uma possível prática, devendo ser investigado se o recebimento de mercadorias em território nacional efetivamente veio de uma operação concreta da empresa offshore, assim como se o dinheiro recebido por ela corresponde à contraprestação daquela mercadoria importada. Frente a uma possível prática de crime de lavagem de dinheiro, as autoridades competentes devem investigar para checar se efetivamente há provas e indícios caracterizadores da infração penal

Combustível Legal: Como se dá essa prática?

Julio Janolio e Octávio Alves: Há a possibilidade de abrir empresas de fachada offshore, que recebem dinheiro pela prática de operações de comércio exterior, que, na realidade, ou não ocorreram, ou a mercadoria era de outra empresa.

Combustível Legal: É difícil estimar o dinheiro desviado para essas empresas?

Julio Janolio e Octávio Alves: Apenas dados concretos de investigações podem fornecer esse tipo de informações, porém, vale ressaltar que é comum no mercado de combustíveis ocorrer movimentações de elevadas quantias, tendo em vista o volume de produto movimentado constantemente, enquanto essencial a todo o mundo.

Combustível Legal: Outra prática muito utilizada seria a compra e venda do etanol sem nota, ou com nota falsa, ou simplesmente duplicada. Como isso ocorre?

Julio Janolio e Octávio Alves: A distribuidora adquire o etanol sem nota fiscal da usina, ou com nota falsa, e repassa sem nota, ou novamente com nota falsa, ao varejista de combustível.

Isso é para evitar o pagamento dos tributos sobre o etanol em toda a cadeia econômica, pois as vendas passam por baixo do radar do fisco.

Importante salientar que para o etanol hidratado, o imposto deve ser pago pelo produtor (usinas) e pela distribuidora, que também fica responsável pelo pagamento do imposto relativo à venda pelos postos de serviços (varejistas).

Combustível Legal: Novamente o mercado regular é afetado?

Julio Janolio e Octávio Alves: Sem dúvida. Como a tributação sobre o etanol é elevada, contribuintes que realizam essa conduta conseguem praticar um preço extremamente competitivo em evidente desequilíbrio com aqueles que pagam devidamente os tributos.

Combustível Legal: Cálculos do setor apontam que apenas no Rio de Janeiro, alguns milhões de litros de etanol sem nota fiscal, ou nota falsa, foram aprendidos nos últimos anos. Ou seja, mesmo com fiscalização, esse negócio é tão lucrativo que justifica essas perdas?

Julio Janolio e Octávio Alves: Provavelmente, sim. O elevado montante de apreensões no Estado do Rio de Janeiro mostra que a questão da sonegação e da inadimplência contumaz envolvendo o setor de etanol é mais grave naquele Estado.

Combustível Legal: Por que o Estado do Rio é tão afetado por essa prática?

Julio Janolio e Octávio Alves: A força motriz desse elevado número de operações irregulares no território fluminense decorre da elevada carga tributária do ICMS no Rio de Janeiro, cuja alíquota aumentou de 24% para 34% em 2019, sendo que nos estados vizinhos, a alíquota é bem menor (SP: 12% e MG: 14%).

Combustível Legal: Estamos diante de um caso: a tributação do estado ajuda o crime organizado?

Julio Janolio e Octávio Alves: A carga tributária elevada incentiva a atuação de sonegadores a adquirirem etanol nos estados vizinhos e venderem internamente no Rio de Janeiro sem pagar o diferencial da tributação, acarretando desequilíbrio concorrencial em prejuízo daqueles que recolhem o imposto regularmente no Estado do Rio de Janeiro.

Combustível Legal: O que falta para resolver essa questão?

Julio Janolio e Octávio Alves: É importante que o Estado do Rio de Janeiro ajuste as alíquotas de ICMS para desincentivar as vendas interestaduais fictícias, considerando diferencial existente entre estados vizinhos (RJ-34%, SP-12% e MG- 14%) por meio da aprovação do PL nº 602/2019 na ALERJ. Na justificativa, há um estudo da SEFAZ/RJ que demonstra os problemas na alíquota elevada e que essa alta carga tributária reduz a arrecadação.

Outro ponto importante é a necessidade de aprovação do recente Projeto de Lei 51/2020, que susta o decreto 43.739/2012 do ex-governador Sérgio Cabral. Esse decreto concede tratamento tributário especial para a produção de etanol e açúcar no Estado do Rio. Na prática, esse decreto causa um impacto concorrencial porque muitas vezes o etanol é produzido pelas usinas com o incentivo fiscal, e a distribuidora que adquire o produto não paga o imposto, de modo que há a venda indevida nos postos de etanol incentivado com carga tributária bem inferior ao que deveria existir.

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